quarta-feira, 16 de julho de 2014

Pensar no futuro

 
Sete da comissão técnica se uniram para falar após o massacre por 7 a 1, mas não admitiram os erros do trabalho brasileiro (Ricardo Stuckert/CBF)

O Brasil perdeu, mas, principalmente, este modelo de futebol atrasado foi goleado. Ao demitir Mano Menezes, quando parecia que ele estava se acertando, a Confederação Brasileira de Futebol optou pela contratação de dois escudos, o técnico Luiz Felipe Scolari e o coordenador Carlos Alberto Parreira. A dupla havia comandado os dois últimos títulos mundiais da seleção brasileira, portanto, a CBF estaria fazendo tudo que é possível para vencer a Copa no Brasil. 

Antes da Copa das Confederações, apesar de muitas ressalvas, fiz um texto afirmando que aquele time poderia dar certo. Mesmo com o título e a grande atuação frente à Espanha, não foi uma trajetória linear e sem problemas. Os Canarinhos viveram altos e baixos e, muitas vezes, foram dependentes de chutões, jogadas individuais e da marcação pressão, que viveu o auge na final, mas não foi presente em toda a trajetória. Sem participação do meio-campo na criação das jogadas e, com momentos de problemas nas demais estratégias, o Brasil mostrou claramente seus problemas. 

A maior parte das falhas de um ano atrás foram repetidas durante o Mundial 2014 e foram potencializadas pela ótima exibição da Alemanha. Os doze meses não conseguiram solucionar os problemas. Mesmo sem se reunir muito, quando esteve junta, como na Copa do Mundo, o Brasil foi acusado de ter treinado e trabalhado pouco. A comissão técnica defendia a necessidade de descanso entre as partidas, algo que deve ser pensado mesmo. Porém, ao compararmos com outras seleções, vemos que isto não foi comum. A Holanda, após a batalha contra Costa Rica, em que só conseguiram vencer Keylor Navas, nos pênaltis, retornou ao Rio de Janeiro, não treinou de manhã, mas à tarde os jogadores foram para o campo. 

A ilusão de que estava tudo certo, não acabou com o 7 a 1, em que a Alemanha dominou amplamente o Brasil. Um dia após a derrota, Parreira e Felipão deram uma entrevista coletiva, na Granja Comary. Constrangimento resume o atendimento à imprensa, que teve momentos excepcionais do Coordenador Técnico da seleção, apoiado pelo comandante do time. “Não houve um erro. Tudo foi perfeito. Só não funcionou o resultado contra a Alemanha”. E, claro, amenizar a responsabilidade do pratão também ocorreu, o campeão Mundial de 1994 destacou que “a CBF não forma jogadores”. A Federação alemã de Futebol (DFP) forma. 

O exemplo alemão 


Alemanha campeã europeia sub-21 2009 cedeu seis jogadores para o título de 2014, todos eles titulares: Neuer, Boateng, Hummels, Höwedes, Khedira e Özil (Getty Images)

A matéria do Jornal inglês The Guardian, em maio de 2013, mostra o que acontece na Alemanha, pois este trabalho não chama atenção apenas no Brasil. O programa de desenvolvimento de talentos da DFB nasceu em 2003, com o objetivo de identificar futuros jogadores e, desde cedo, trabalhar as habilidades e o conhecimento tático neles. O resultado é visto na prática, pois, nos últimos anos, a Alemanha voltou a figurar entre as principais potencias do futebol mundial. 

 Sobre este trabalho de base, fiz um texto depois da Copa de 2010, tentando prever a Nationalelf para 2014. Mais da metade dos 23 convocados para o Brasil foram citados no texto. O bom índice de acerto não é mérito do blogueiro, tem muita relação com a continuidade do trabalho de Joachim Löw e o bom aproveitamento dos talentos da base. Seis campeões europeus sub-21, em 2009, vieram ao Brasil, na verdade, oito, pois Dejagah e Fabian Johnson também estiveram no Mundial, mas defendendo Irã e Estados Unidos, respectivamente. 

O diretor esportivo da Federação, Robin Dutt, que está no cargo desde agosto de 2012, explica que ajudar os clubes na formação de jogadores é ponto central desta evolução e é uma relação positiva para os dois lados. “Se nós ajudamos os clubes, eles nos ajudam, pois os atletas das nossas seleções – de base ou da equipe de Joachim Löw – vêm dos times”. Um exemplo da parceria é a obrigação dos clubes de 1ª e 2ª divisão, que têm que ter academias para formar jovens, com disputa a partir dos 12 anos. Para atingir o objetivo da norma, a DFB auxiliou financeiramente na montagem desta estrutura de base. 

Mas investir apenas na base não é a única contribuição da DFB ao futebol. Como apresentado no Linha de Passe, da ESPN Brasil, do dia 10 de julho, a Alemanha trabalhou para fortalecer a liga local. Ajudar o desenvolvimento dos jovens é um passo para isso. Por isso, hoje, a Bundesliga é uma das principais do planeta e isto contribuiu para o crescimento da Nationalelf. Portanto, há a necessidade de um trabalho mais complexo, não apenas investimento em um setor. 

Brasil quer se mexer? 

Jornalistas esportivos e, depois, o Bom Senso Futebol Clube por duas vezes foram recebidos pela presidência da república. Porém, até aqui, nada foi feito na prática (Roberto Stuckert Filho)

Ao contrário do que é realizado na Alemanha e, em outros países, onde o sucesso ainda não veio, o futebol brasileiro não parece querer evoluir. A CBF está deitada em berço esplêndido e recusa iniciativas para trabalhar o esporte no país. Parece que modernizar o que é feito aqui não é do interesse da entidade. Com o sucesso em campo, conquistado através do talento dos jogadores, que seguem surgindo aqui, nada ou muito pouco foi realizado para repensar o futebol, afinal, não era necessário, pois vencíamos.

O comando da CBF é o mesmo desde 1989, quando Ricardo Teixeira assumiu a presidência, durante o governo de José Sarney (PMDB). O domínio do ex-genro do ex-presidente da FIFA, João Havelange, portanto, resistiu aos presidentes Fernando Collor (PRN), Itamar Franco (PRN), Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Não citei Dilma Rousseff, pois foi no atual governo que Ricardo Teixeira se foi. Após muita pressão de mídia, população e do setor político, Ricardo Teixeira saiu, mas não mudou muita coisa. 

O sucessor foi o antigo apoiador da ditadura e vice-presidente mais velho da CBF, José Maria Marin, filiado ao PTB e com extensa carreira na política. Portanto, o perfil do comandante que pouco se importa com o futuro do futebol seguiu. O próximo presidente da entidade já está definido e será Marco Polo Del Nero, atual vice-presidente. Mesmo cuidando de algo de interesse público, a entidade é privada, por isso, em teoria, o governo não poderia intervir nela. Mas, como revelou Juca Kfouri, o STF já tem decisão que mostra o contrário

Portanto, interferir no comando da CBF é possível e, pelas recentes declarações de Dilma e do ministro do Esporte Aldo Rebelo (PC do B), este é o interesse do atual governo. Antes da Copa, a presidente recebeu uma série de jornalistas esportivos e disse que o grande legado do Mundial 2014 seria a melhoria do futebol praticado no Brasil. Na ocasião, ficou prometida uma reunião entre o Palácio do Planalto e o movimento Bom Senso Futebol Clube. Desde então, já foram duas conversas com o grupo de jogadores, que também tem especialistas em diversas áreas (administração, direito e etc), e a impressão de que uma participação do estado no comando do futebol brasileiro está próxima de acontecer. 

Por falar nisso, o BSFC é uma grande iniciativa de craques brasileiros que visam a melhoria do futebol como um todo, não só na elite. Porém, a blindagem da CBF impede que as ideias do grupo sejam trabalhadas para serem postas em prática. Um calendário mais justo, emprego por mais tempo para os jogadores fora das principais divisões, horários melhores para prática do futebol e a exigência do fair play financeiro para os clubes (como ocorre na Alemanha). Com estas medidas, com certeza, teríamos uma melhora sensível no futebol brasileiro: mais organização que refletiria em melhores desempenhos em campo e públicos maiores nos campeonatos locais, algo raro hoje. 

Esta sinalização governamental de intervenção na administradora do futebol brasileiro e, ao mesmo tempo, a conversa com o Bom Senso mostra consciência da necessidade de mudanças. Se elas forem as indicadas pelos jogadores, que não são ouvidos pela CBF, pode ser um caminho interessante para a modernização do atrasado futebol brasileiro. Porém falta deixar de ser vontade e se tornar uma prática. 

Voltando para dentro de campo 

Os Canarinhos, com Mano Menezes, pareciam ter um técnico que dialogava melhor com o que era realizado no futebol europeu, porém os resultados não vieram. Não custa lembrar que, na Copa América 2011, o Brasil caiu nas quartas de final e, em nenhum momento, conseguiu convencer. Na reta final do trabalho, como já dito, os Samba Boys melhoraram, mas novamente, a CBF influenciou negativamente o que é realizado dentro de campo, buscando uma dupla ultrapassada – e com nome – para comandar a equipe. 

Além das boas ideias, que, na reta final, estavam dando resultado. No período de Mano Menezes, algo muito interessante aconteceu na seleção e, se as mudanças aparecerem, pode virar uma marca dos Samba Boys. Como o repórter e colunista do site Terra, Dassler Marques escreveu, no antigo Olho Tático, de André Rocha, no Globoesporte.com, a seleção chegou a ter um esquema tático unificado do sub-17 ao time principal

A Bélgica, depois de duas copas fora, veio ao Brasil e chegou com bastante badalação, tendo a unificação do esquema tático como um dos pilares desta renovação, mas principalmente, a linearidade da forma de pensar futebol. Como Dassler escreveu no post sobre o Brasil, jogar no mesmo sistema não é o ponto centrale, sim, ter a mesma mentalidade. Pois assim, não limitamos o jogador da base a cumprir apenas uma função, mas, desde o princípio, fica claro o estilo de futebol que o jovem irá encontrar quando passar a atuar entre os adultos. Afinal, o objetivo de times e seleções de base é preparar os atletas para os times principais. 

A falácia da fraca geração brasileira 

O brasileiro do Hoffenheim, Roberto Firmino teve ótimos números na Europa e nem foi testado. Nenhum jogador verde e amarelo fez, em 37 jogos, 22 gols e 16 assistências.  (Alex Grimm)

Uma das justificativas utilizadas por mídia e comissão técnica, para o insucesso dos Canarinhos, é que a atual geração de jogadores verde e amarela é fraca. Para mim, uma grande mentira. Thiago Silva, Marcelo e Neymar são futebolistas da elite do futebol mundial. Além deles, Júlio César, Maicon e Daniel Alves já fizeram parte do grupo de maiores craques do planeta. Portanto, apenas seis jogadores que podem – ou já puderam – ser considerados especiais Mas, a maior parte dos outros convocados, estão ou estiveram em grandes clubes e jogaram em alto nível, no futebol europeu. Um ou outro jogador, talvez Jô e Henrique ainda não tiveram – e nem deverão ter – um momento de futebolista top mundial. 

Além do elenco de 23 escolhidos para representar o Brasil em casa, vários jogadores de bom nível ficaram de fora, por exemplo, Diego Alves, Rafinha, Miranda, Alex, Filipe Luís, Lucas Leiva, Felipe Melo, Fernando Reges, Diego Ribas, Philippe Coutinho, Lucas Moura, Roberto Firmino e Jonas. E é bom lembrar, Ronaldinho Gaúcho, Kaká, Robinho, Nilmar, Luís Fabiano e Adriano são integrantes da geração 2014, poderiam tranquilamente estarem presentes no Mundial disputado em casa, mas, por escolhas erradas e queda de nível, o sexteto não chegou à disputa. 

Entre os convocados para a Copa e os outros citados, muitos poderão estar em 2018 e serão mesclados com outros jogadores jovens que já começaram a se destacar. Três bons goleiros estão na Serie A da Itália, Gabriel (Milan), Rafael Cabral (Napoli) e Neto (Fiorentina). Na defesa, Danilo (Porto), Rafael (Manchester United), Juan Jesus (Internazionale), Dória (Botafogo), Marquinhos (PSG), Alex Telles (Galatasaray), Wendell (Bayer Leverkusen) Alex Sandro (Porto). No meio, Fernando (Shakhtar Donetsk), Casemiro (Real Madrid), Rômulo (Spartak Moscou), Lucas Silva (Cruzeiro), Fred (Shakhtar Donetsk), Rafinha (Barcelona), Paulo Henrique Ganso (São Paulo) e Douglas Costa (Shakhtar Donetsk). No ataque, Lucas Piazon (Chelsea), Wellington Nem (Shakhtar Donetsk) e Gabriel Barbosa (Santos). Tantos outros podiam ter citados, mas, para mim, vendo de hoje, esses são os destaques para o futuro mais próximo dos Samba Boys

Pode ser que nem todos os citados consigam chegar a – ou retomar – um nível altíssimo de futebol, mas está claro que há talento e muitos deles já tiveram passagens pela seleção. Esses atletas mais jovens, se forem bem trabalhados e mesclados com alguns dos atuais jogadores, poderão trazer bons frutos para o Brasil. Alguns, inclusive, têm idade para disputar os Jogos Olímpicos de 2016, em casa. E, com a saída de membros do grupo de 2014, muitos deles devem ter espaço durante toda a preparação. 

Portanto, dizer que o Brasil não produz mais tantos craques, pode até ser verdade (muito por culpa de fatores organizacionais), mas afirmar que o talento por aqui acabou é uma grande mentira. O caminho para voltar a brigar pela hegemonia do futebol é longo e, para isso, escolher um bom comandante é um dos primeiros passos a ser dado. 

Quem poderá liderar? 

Nos últimos anos, ninguém se destacou tanto como Tite. O ex-técnico do Corinthians mostra conhecimento tático e entendimento do que se faz no mundo, como conceito de futebol. Depois de encerrar a trajetória vitoriosa na equipe paulistana, o gaúcho foi presença constante em jogos de Liga dos Campeões e campeonatos europeus. Apesar de ótimo trabalho, Tite não se acomodou e foi atrás de mais informações para melhorar. Por isso, seria a minha escolha como figura central deste novo ciclo. 

Porém, com a atual cúpula da CBF, parece improvável a escolha de uma pessoa atualizada e que possa tomar as rédeas de todo o trabalho da seleção brasileira. Como o comentarista da ESPN Brasil, Mauro Cezar Pereira falou: “se for para eles ficarem (dirigentes da CBF), que seja como uma rainha da Inglaterra, que tem gente abaixo com o controle das ações a serem tomadas”. É bom deixar claro, nem eu, nem o MCP queremos que essa turma siga no comando. 

Mas, por mais que não façam nada pela melhora dos Canarinhos e, muito menos, pelo futebol verde e amarelo em geral, os dirigentes não mostram interesse em abrir mão do protagonismo do comando dos Samba Boys. Portanto, há claramente um nome para o novo ciclo. Porém, com o contexto atual, pode vir qualquer grande treinador do futebol mundial que não dará certo. Por isso, a intervenção na Confederação Brasileira de Futebol e a implementação das ideias do Bom Senso Futebol Clube é o caminho e se mostra urgente. 

Palpite dos 23 

Para finalizar, aquele chute clássico, que muitos jornais e sites ousam fazer: quem serão os 23 convocados da Copa do Mundo da Rússia? Goleiros: Diego Alves, Neto e Rafael Cabral. Laterais-direitos: Danilo e Rafael. Zagueiros: David Luiz, Thiago Silva, Marquinhos e Juan Jesus. Laterais-esquerdos: Marcelo e Alex Sandro. Volantes: Fernando Reges, Casemiro e Paulinho. Meias e Meias-atacantes: Lucas Moura, Oscar, Neymar, Roberto Firmino, Philippe Coutinho, Rafinha e Paulo Henrique Ganso. Atacantes: Lucas Piazon e Gabiel Barbosa.

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